A enchente de 1941 e a tragédia de 2024, o que mudou

O que diferencia a situação de agora, em relação ao que aconteceu há 83 anos, é que um grande volume de chuvas se concentrou em um curto período de tempo

Silvestre Santos
silvestre@ofarroupilha.com.br

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Entre os dias 30 de abril, e 1º e 2 de maio deste ano, a precipitação pluviométrica na Serra Gaúcha extrapolou todos os registros feitos pelos institutos de climatologia do estado e de fora do Rio Grande do Sul. Foram 450 milímetros de chuva apenas nestes três dias, volume suficiente para causar todo o estrago que houve. “Não se tem notícia de algo igual, nunca havia caído um total de 450 milímetros de chuva em um mês. E daí resolveu chover tudo isso em três dias”, conta o empresário Eduardo Anselmi, diretor da Malharia Anselmi, dono de cinco estações meteorológicas no estado.

Ele compara o que aconteceu no início de maio com a grande enchente ocorrida no Rio Grande do Sul há mais de 80 anos. “Na cheia de 1941, em toda rede de estações que existia na época, pouquíssimas registraram precipitação acima de 100 milímetros em apenas um dia. Nesse evento de agora, quase todas as estações anotaram chuvas acima de 100 milímetros nestes três dias”, conta o meteorologista amador. “Por isso é que aconteceu tudo isso, especialmente no vale do Rio das Antas”, enfatizou.

Os registros apontados por Anselmi dão conta que entre 30 de abril e 2 de maio, Farroupilha sofreu uma inundação de mais de 473 milímetros de chuvas, contra 456 milímetros registrados pela estação do Inmet em Bento Gonçalves. “Na cheia de 1941, onde mais choveu foi na região de Soledade, com 870 milímetros acumulados no período de aproximadamente um mês, e sem que tenha acontecido uma sequência violenta como a que houve agora e que pegou quase todo o estado, de forma generalizada. A brutalidade desta chuva de agora não tem comparação”, diz Eduardo

O mesmo volume de água que caiu num curto espaço de tempo de agora, diluído no período de quase 30 dias, fazem muita diferença. “Se chover 30 milímetros por dia, teremos 900 milímetros em um mês. Qual estrago pode causar 900 milímetros em 30 dias comparado com 450 milímetros em três dias? O que aconteceu agora foi muito pior porque o solo não teve tempo para absorver toda água que caiu, e a mata ciliar não foi suficiente para conter as encostas”.

Sem registro na história milenar

Eduardo Anselmi conta que teve acesso a estudos científicos que pesquisaram comunidades indígenas que viviam no Delta do Jacuí e não encontraram, em sedimentos analisados, sequer indícios de uma cheia tão violenta, em milhares de anos. “Isto é um fato absurdo. O que aconteceu, as pessoas não têm noção do quanto anormal isso foi”, afirma, e faz um prognóstico: Vai acontecer de novo. Até cita uma máxima segundo a qual, quanto mais tempo passa desde que algo aconteceu, mais próximo está de ocorrer outra vez.

Na série história que acompanha, Eduardo assegura que a precipitação de 450 milímetros, em três dias, não encontra precedente. “É mais do que o dobro para um mês de abril inteiro, de todos os registros já realizados”, garante ele. Dados de institutos de climatologia apontam que no ano de 1941, entre 13 de abril e 6 de maio, choveu em Bento Gonçalves 423 milímetros e, em Soledade, 870 milímetros, bem diferente do volume que, agora, caiu no curto espaço de tempo de três dias.

Na chuvarada mais recente, segundo os dados do Inmet aos quais Eduardo teve acesso, entre abril e maio, em Bento Gonçalves a precipitação alcançou 1.093 milímetros e, em Caxias do Sul, 1.165 milímetros. E Farroupilha está entre estas duas cidades. Uma coisa, explica, é chover tudo isso em um longo período, de três a quatro semana. Outra, é esta água toda descer em questão de poucos dias. O impacto é muito mais devastador.

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