Combate à violência doméstica: a coragem nasce da informação
A perspectiva de um atendimento especializado às mulheres vítimas de violência doméstica em Farroupilha pretende estimular um ato imprescindível para romper o ciclo: a denúncia. Este foi um dos principais temas do workshop “Mulher, Respeito Mútuo”, liderado pela chefe da Polícia Civil do Estado, Nadine Anflor
Na tarde de terça-feira, 16 de abril, o Restaurante Parque dos Pinheiros foi local de encontro para falar sobre violência doméstica, no workshop intitulado “Mulher, Respeito Mútuo”. Organizado pela Prefeitura Municipal, o evento contou com a presença e esclarecimentos da chefe da Polícia Civil do Rio Grande do Sul, Nadine Anflor, e das delegadas Carla Zanetti, da Delegacia Especializada em Atendimento à Mulher (Deam) de Caxias do Sul e da delegada Deise Salton Brancher Ruschel, da Deam de Bento Gonçalves.
Vale ressaltar que a delegada Nadine é a primeira mulher a ocupar o cargo de chefe de polícia no Rio Grande do Sul, tendo sido titular da Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher (Deam) de Porto Alegre por sete anos. “Após 177 anos de história, a instituição é comandada, pela primeira vez, por uma mulher. Como chegamos até aqui? Basta querermos. A mulher pode estar em qualquer lugar. Hoje, somos 38% de mulheres dentro da Polícia Civil”, afirmou a delega em seu discurso de empoderamento feminino, que abriu a tarde de informações.
A plateia predominantemente feminina, composta por mulheres dos serviços municipais, de empresas e interessadas, ouviu da chefe da Polícia Civil o anúncio da criação de uma sala destinada ao atendimento às mulheres vítimas de violência, por ocasião da inauguração da nova sede da Polícia Civil, no prédio do antigo Fórum. “Tenho absoluta certeza de que no início vamos nos assustar porque o número de ocorrências irá aumentar, pois quando a gente oferece o serviço, este tipo de delito aparece porque é um delito que as mulheres não têm coragem de denunciar e romper o ciclo da violência”, informou.
“Precisamos dar grandeza aos grupos minoritários e respaldo às mulheres que sofrem violência e precisam de ajuda. Em Farroupilha queremos fomentar a rede de atendimento”, disse a delegada Nadine, anunciando ainda que a Polícia Civil vai lançar, em breve, o “PC Acolhe”, um lugar humanizado dentro dos plantões das Delegacias de Polícia de Pronto Atendimento (DPPA), que atendem, em horários fora do expediente, as vítimas de violência.
Ela também ressaltou a importância da independência financeira da mulher para que o círculo de violência seja rompido, mencionando a necessidade de rever conceitos da sociedade, “que ensina desde cedo o menino a sobreviver em um mundo competitivo, enquanto a menina fica em casa, cuidando dos afazeres domésticos”.
Delegadas
Existem hoje, no Estado, 22 Delegacias Especializadas em Atendimento à Mulher (Deam). Na serra, uma unidade está em Caxias do Sul e a outra em Bento Gonçalves.
“A violência é tolerada em silêncio. Apenas 10% denunciam seus agressores”, entregou a delegada Carla Zanetti, da Deam de Caxias do Sul, que ainda falou sobre a lei Maria da Penha.
Já a delegada Deise Salton Brancher Ruschel, da Deam de Bento Gonçalves, explicou sobre as Medidas Preventivas de Urgência, que são providências de proteção que podem ser solicitadas pelas mulheres que precisam ser afastadas da situação de risco. “As medidas preventivas são excelentes ferramentas e podem ser solicitadas em qualquer delegacia de polícia”, mencionou, exemplificando as circunstâncias em que elas podem ser pedidas.
A delegada de Bento também expôs sobre o Grupo Reflexivo Despertar, destinado aos agressores, com o intuito de provocar uma reflexão pra que lidem de forma diferente com os conflitos familiares. “De cada 10 homens que participam deste grupo, apenas três voltam a praticar a violência familiar”, comentou a delegada Deise.
Farroupilha
Segundo informações da Polícia Civil, em Farroupilha, de primeiro de janeiro a 12 de abril de 2019, foram registrados 128 boletins de violência doméstica; 98 inquéritos instaurados; 12 inquéritos em andamento e 77 medidas preventivas solicitadas.
Para o delegado Rodrigo Morale, encontros como este, ocorrido na tarde de terça, são fundamentais. “Aproximam a comunidade da polícia civil, aproximam também as entidades que participam deste enfrentamento contra a violência doméstica para que o serviço público seja prestado de uma melhor forma para estas vítimas”, opinou, quando questionado pelo Jornal O Farroupilha.
O primeiro passo para combater a situação é registrar a ocorrência na delegacia, como lembrou o delegado Morale.
“Eu aconselho a estas mulheres que estão sofrendo violência dentro de casa a criarem coragem, pois tem muita gente trabalhando para tirá-las deste ciclo. Estamos aqui para auxiliar e dar os meios para elas, mas a decisão tem que partir delas, a decisão de mudarem a realidade e para isso é preciso dar o primeiro passo”, respondeu a delegada Carla, de Caxias do Sul, onde também são feitos registros de ocorrências de casos de Farroupilha.
A chefe da Polícia Civil ainda expôs que 70% das mulheres mortas no Rio Grande do Sul nunca fizeram uma ocorrência policial ou pediram uma medida protetiva de urgência. “Teremos a sala individualizada para o acolhimento para fazer com que as mulheres denunciem. É através da prevenção, de uma tarde como esta que tivermos em Farroupilha, estimulando as Secretarias do município, que vamos cumprir a missão que não é só uma missão da polícia, mas também do profissional da saúde, que pode identificar uma mulher que está sendo vítima de violência e fazer com que ela denuncie para evitar um crime maior, que é o feminicídio. O combate ao feminicídio tem que ser um movimento das famílias”, defendeu a delegada Nadine.
Segundo ela, a Polícia Civil sempre trabalhou com o número aquém do que gostaria e por isso é preciso agir de forma integrada. “Temos que nos unir e trabalhar mais integrado com a Brigada Militar. Estado e município juntos porque Segurança Pública não é mais um dever só da Polícia Civil. Integração é a única saída para suprirmos a falta deste efetivo que temos”, disse, explicando que apesar dos 400 novos policiais que devem começar a atuar em junho, outros 700 já podem solicitar aposentadoria.
Muitas diretrizes foram fornecidas no encontro. Como disseram as profissionais que lidam com o assunto em suas rotinas, “quem sofre violência se encolhe”, mas a informação é uma poderosa arma de combate às situações que machucam muito além do corpo físico. Denunciar é preciso. Com a criação da sala especifica para este atendimento, nossa cidade pretende facilitar o caminho para isso. É uma questão de tempo.