Enxergando com os ouvidos

           Empatia. Palavra que caiu nas graças das pessoas, cujo significado tem sido bastante trabalhado nas relações interpessoais. Nesta semana, uma visita à Associação Farroupilhense de Deficientes Visuais, AFADEV, me fez experimentar a fusão emotiva gerada por ela. Recebida pelo Pablo Barretti, presidente, tive os olhos vendados e, conduzida por ele, conheci a associação por suas palavras. Naqueles minutos pude estar no lugar dele, deficiente visual, e o que eu senti não cabe em palavras escritas.
          Quando a venda foi tirada, olhei para ele e fiquei admirada com o fato daquele homem de 37 anos ser independente, levar uma vida normal e ainda cursar a faculdade de Tecnologia de Processos Gerenciais. Ele tinha uma vida e foi obrigado a aprender a viver outra. Vive bem.
           Por tamanha força, Pablo desperta o encantamento nas pessoas com as quais convive. É um homem inteligente, alegre, bem-humorado. Tanto é verdade que seus colegas de faculdade se juntaram e criaram uma campanha para angariar recursos para a aquisição dos óculos inteligentes, equipados com uma câmera que faz a leitura em formato de áudio de tudo o que ele pegar na mão, ou apontar.
          Com estes óculos, é possível identificar pessoas gravadas no aparelho, fazer contagem de dinheiro, leitura de material impresso – textos e trabalhos da faculdade – enfim, é uma tecnologia que vai fornecer ainda mais autonomia ao Pablo. Hoje eu tenho independência e se tiver que ir para o Japão, eu vou. Devagar, com a minha bengala, mas vou, atesta.
          Sem enxergar tem coragem de ir ao outro lado do mundo, imagine aonde pode chegar com os óculos inteligentes?
Temos orgulho do Pablo ser essa pessoa diferenciada, que se move pelos desafios que a vida lhe pregou. Ele nos motiva ainda mais a seguir nossas batalhas na faculdade, pois com ele ali pertinho de nós, vemos diariamente como tudo é possível e que muitas vezes podemos deixar de reclamar pelos nossos problemas e ver que temos muitas oportunidades de transformar nossos dias e nossas vidas com força de vontade, que o Pablo tem de sobra. Temos total apoio da faculdade, diversos doadores alunos e, claro, um comitê da turma, que está ativamente discutindo os avanços da campanha e criando planos para aumentar a renda para conseguirmos adquirir os óculos, diz André Miranda, um dos criadores da campanha Vakinha do Pablo.
          Para ajudar, basta acessar https://www.vakinha.com.br/vaquinha/a-visao-do-pablo-pra-estudar e dar a sua contribuição. O valor necessário para a compra dos óculos é de R$ 18.900,00 e até o fechamento da matéria tinha sido arrecadado R$ 5.490,00. A campanha se encerra no dia 18 de junho, portanto, é uma corrida contra o tempo.
         Não encontro barreiras naquilo que precisa ser feito porque por já sofrer o que sofri, procuro entender tudo como se fosse uma competição, que requer muita dedicação e envolvimento, diz o homem que gosta de esportes (chegou a cursar a faculdade de Educação Física) e mostra suas habilidades no GoalBall, esporte paralímpico desenvolvido especificamente para deficientes visuais.

         Vida
         Até os 20 anos, Pablo enxergava, mas perdeu a visão por causa de uma avassaladora e rara alergia causada por medicação (Dipirona, no caso) e não combatida a tempo devido a um erro de diagnóstico médico. Ele havia contraído a síndrome de Stevens Johnson e o médico o mandou para casa porque disse que estava com Varicela e Conjuntivite.
         Na árdua luta contra a doença, Pablo recuperou parcialmente a visão em 2007 e em 2011 a perdeu definitivamente. Pelas dificuldades da nova condição, passou a auxiliar as pessoas com deficiência visual na AFADEV, que ajudou a fundar, há 14 anos, e hoje preside. Dou aulas de alfabetização em Braile, ministro palestras, faço o que tiver que fazer e com bom humor, levo minha deficiência na brincadeira, confessa, só ele sabendo o que precisou passar para chegar a este ponto.
        Pablo é um voluntário muito atuante na AFADEV, que desenvolve ações da assistência social que possibilitam o acesso à educação, habilitação e reabilitação para a autonomia, a inclusão social e a melhoria da qualidade de vida das pessoas com deficiência visual. Hoje, há 43 pessoas associadas.
        Na associação também trabalha a esposa de Pablo, Sofia. Eles se conheceram em Caxias do Sul e estão casados há seis anos. Filhos fazem parte dos planos, segundo Pablo.
        Com as adaptações necessárias para que seja independente ao extremo – o celular de Pablo, por exemplo, é usado normalmente, mas com o recurso para deficientes visuais, o farroupilhense é um exemplo de superação. Eu tinha muitos sonhos, comuns aos jovens, como jogar futebol, dirigir o primeiro carro, enfim… Já não me sinto cego mais porque sou muito independente. Sempre que eu puder compartilhar conhecimentos, vou fazer, diz, mencionando que tem ideias de dar aulas no futuro.
       Se ele é capaz de ir ao Japão, imagine dar aulas! Está estudando, tirando notas altas e precisa contar com a ajuda de todos para adquirir os óculos inteligentes.
       Não sabemos como seria o Pablo caso ele não tivesse perdido a visão. Talvez tivesse esta mesma personalidade provocadora de resultados, capaz de fazer as pessoas ao redor dele vivenciarem conceitos fortes, como o da empatia. O Pablo de hoje faz isso como ninguém e ao transmitir o quanto é vital se colocar no lugar do outro, ensina muito além do que pretende ensinar.
 

Sua colaboração

Além de ajudar o Pablo na aquisição dos óculos, acessando e contribuindo pelo: https://www.vakinha.com.br/vaquinha/a-visao-do-pablo-pra-estudar, você também pode participar das campanhas da AFADEV, como:
– Campanha Latinha Feliz, na qual você leva as latinhas de alumínio, limpas, à sede da associação;
– Campanha Tampinha Feliz, junte e leve as tampas plásticas de todos os tipos à sede da associação. Os valores arrecadados são revertidos em benefícios à associação.
– Nota Fiscal Gaúcha, na qual a AFADEV pode ser indicada como entidade a ser beneficiada na área de Desenvolvimento Social.